SEGUINDO EM FRENTE

A rua estava praticamente vazia, com as lojas quase todas fechadas por conta do frio. O inverno deixava a cidade com um ar de tristeza e vazio. Pensamentos aleatórios me faziam parar a cada passo dado.

Ajustei o capuz sobre a cabeça, arrumando meus cabelos rebeldes que insistiam em cair sobre meus olhos, e voltei as mãos para dentro do casaco que havia ganhado no Natal passado.

Entrei na cafeteria em frente à livraria — que, por sinal, ainda estava fechada — e o cheiro de café invadiu o meu ser. Sentei na oitava mesa, ao lado das janelas. Os vidros embaçados impossibilitavam a visão do lado de fora.

Peguei meu caderno surrado e comecei a escrever pequenas frases, enquanto decidia se era uma boa ideia estar ali. Fiz o impossível para não pensar nas lembranças que me atormentavam desde sempre, mas foi em vão. 

O som dos sinos da porta, anunciando que alguém estava entrando, me despertou do meu idiota delírio.

Ao olhar em direção à porta, me deparei com um rosto familiar, parecia surreal — quase como um pesadelo. Era a última pessoa que eu esperava encontrar naquela manhã, ou em qualquer outra.

Era a mesma pessoa que tirava o meu sono há tanto tempo, que me fazia sorrir com suas fotos engraçadas ao lado de amigos no Instagram, que me convidou para aquela festa completamente louca. Era a mesma pessoa que esbarrou comigo há três anos, me jogando para a calçada coberta de neve, e me ofereceu um café naquele dia: era ele. Sim, era ele!

Pequenos flashs das nossas poucas conversas passavam como um filme na minha cabeça. Nossos sorrisos bobos, sua paixão incurável por filmes de ação, sua teoria sobre o amor: "o sentimento mais forte que existe no mundo, capaz de acabar com qualquer dor", e sua admiração pela garota que passa tempo suficiente para amá-la.

Ele já gostava de alguém e, mesmo assim, eu não me importei. Em um pequeno frasco de chances, acreditei que ele poderia gostar de mim, que me olharia da mesma forma que olhava para ela. Sinto muito por ter pensado assim.

Seu sorriso ainda era radiante, e seus olhos — naquele tom de azul impossível de esquecer — me atingiram em cheio. Achei que não reconheceria aquele sorriso que me fazia tão mal, que fracasso. Como pude pensar que não o distinguiria em meio a uma multidão?

Meu olhar caiu sobre suas mãos entrelaçadas com as dela. Por um minuto, esqueci que seu coração batia por outro alguém.

Poderia te querer tanto, mesmo não podendo te querer? Não tenho esse direito. Ela tem? Provavelmente. Não é uma bela resposta, não é algo que gostaria de pensar neste momento. No entanto, era a mão dela que ele segurava. Era ela, sempre foi, e eu sabia disso.

Desta vez, era com ela que ele estava em nosso café. O mesmo em que nos conhecemos. Era ela — e não eu, com meu suéter vermelho.

Não pensei no frio lá fora, nem na livraria ainda fechada. Levantei e saí andando até a porta, acreditando que ele não pudesse me ver. Lágrimas escorriam descontroladamente. Dentro de mim, uma voz repetia a mesma frase a cada segundo: "Está tudo bem. Ele não te prometeu nada. Aliás, nunca sequer pensou em prometer." 

Num impulso, meu corpo girou na direção oposta à que caminhava. Nossos olhos se encontraram. Seu sorriso foi desfeito e suas sobrancelhas arquearam, como se me perguntassem onde andei todo esse tempo. Mesmo querendo ir ao seu encontro e dizer o quanto o amava, pedi a forças maiores que me ajudassem a continuar com minha jornada em busca de paz.

Sem perceber, andei até a saída. Com as mãos na maçaneta, arrisquei olhar em sua direção uma última vez — mas você já não olhava mais. Abri a porta e segui em frente.

Meu coração desesperado, junto com o Destino — se é que ele existe —, simplesmente arrumou uma maneira de te encontrar mais uma vez.